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Soundtrack 1

Alimentei a solidão como a leões no circo, envolto numa lona de cores. E o carrossel em círculos confunde a minha mente neste turbilhão de azuis, vermelhos e amarelos. Não ensinaram-me os comandos para fazê-lo parar. Voltas e voltas no mesmo sítio, cedem as terras como se preparasse a minha própria cova, atingindo o fundo, o nada coberto de tudo.

O colecionador do tempo (Parte 3)

O velho relógio perdeu o seu habitual tic tac, mas o rapaz não conseguia desfazer-se do pequeno objecto. Mantinha-o dentro de uma caixa vazia ao alcance para observá-lo diariamente, recordando todo o tempo que o inútil relógio havia lhe proporcionado. Ainda que despido de valor emocional, a pequena criatura mantinha-se presa às memórias, temendo que as lembranças o abandonassem, que o tempo perdido as levassem junto. Pobre rapaz, amargurado por um tempo tão inútil que nem as suas batidas soam mais..

Dois mil e doze.

Os primeiros raios de sol do verão atingiram-me violentamente, sem causar incómodo algum. Já aguardava por aquele calor há algum tempo de modo a que me viesse aquecer as incansáveis gélidas mãos. Já dizia o ditado "Mãos frias, coração quente" e quando ambos prestam-se ao mesmo papel, convertendo-se em pequenas partículas de gelo? Ansiava ao menos a calorosa sensação nas palmas das minhas mãos. Mantive-as estendidas e os olhos fechados de modo a fixar aquele afago caloroso em minha memória pelo maior tempo possível. Eram apenas as primeiras horas de verão..

Untitled 1

Ela esperava. E esperou, esperou.. Enquanto os dias passavam e as estações trocavam, uma rajada de vento saudando o inverno trouxe consigo a gélida sensação, palpável, do esquecimento. A pequena vagueava pela velha casa, a madeira rangendo debaixo dos seus suaves passos, tentava em vão queimar o tempo ansiando fugir da realidade que a atingia violentamente a cada tic tac do relógio pendurado na parede da sala, acompanhando o ranger dos passos numa sincronia metódica e inquietante. Voltou-se para trás duas ou três vezes antes de atravessar a porta outrora entreaberta, abandonando a velha casa do esquecimento.
Linhas infinitas, continuidade. O comboio avança em direção a um destino sem início nem fim. Seus passageiros têm consciência de sua infinitude mas permanecem presentes, obrigação pessoal, incluindo John. Segurando-se nas barras verticais do recinto, John pratica um monólogo mental enquanto encara o vidro, sua própria imagem. Todos os outros passageiros imitam tal ação, cada um em seu canto. Ali ninguém se vê, ninguém se conhece, preferem manter o anonimato, véu imaginário cobrindo o rosto. O comboio continuava o seu trajeto, suas linhas paralelas e infinitas oferecendo aos passageiros o castigo necessário para suas almas carregadas. Rápidos flashes de imagens começaram a passar pela sua mente. A pequena garota correndo, os soluços abafados do seu choro misturados com o barulho dos seus rápidos passos, tentativa frustrada de se afastar e afugentar o predador que corria ferozmente em sua direção. Nem o choro daquela pobre criatura fez com que John mudasse as suas intenções. Antes pelo c

Pitanga.

O corpo franzino da pequena seguia o ritmo da serena melodia que soava no ar, enquanto seus pés acompanhavam a batida, de um lado para o outro, embalando o samba. Seus olhos fechados e seus braços estendidos ao lado do corpo desejavam que a música levasse embora toda a preocupação diária, de acordo com o avançar dos segundos naqueles curtos três minutos de som, ou que pelo menos as notas daquela canção tomassem lugar completo na mente carregada. Aquela dança não tinha hora para acabar.

Palavras.

As palavras estão esgotadas. Ideias vagueiam a minha mente, mas nenhuma aceita permanecer. Nem mesmo as pequenas palavras anseiam ser eternizadas. Desejam voar ao sabor do vento, vagueando de mente em mente, sem abandonar o formato de ideia preconcebida, mas nunca revelada. Sinto informar que ela nunca será revelada, a palavra no corpo de ideia abandoná-lo-à e uma nova se produzirá como num ciclo vicioso. Até as palavras estão cansadas do eterno. E me faltam palavras..